Ela chegou só. Parou a porta. Com seus olhos negros, bem delineados, olhou ao redor e resolveu ficar. Não se lembrava ao certo o porquê de estar ali, fora levada pelo vento, pelo acaso. Usava seu vestido preferido, preto, tecido leve e de alças finas. Saltos altos e cabelos soltos. Emanava delicadeza e frescor. Entrou, atravessou o salão. Sentou-se ao balcão e pediu algo para beber com a intenção de sentir-se menos solitária, menos estranha entre tantas conversas e risos que corriam livres pelo lugar.
Observava as gotículas de água que se formavam em torno do seu copo, sorvendo lentamente cada gole. Pensava que só o fato de estar ali já era um tipo de lucro, comparada a rotina do seu quarto vazio...
Continuava a observar o copo com uma atenção tão desatenta que nem percebeu quando ele se aproximou e sentou-se ao seu lado.
Ele nada disse, apenas a fitou com seus olhos esverdeados e assim ficou até ter sua presença notada.
Ela apenas sorriu e voltou para seu devaneio vazio, antes que palavras que não queria dizer saíssem sozinhas de sua boca.
Ele então investiu, como todas as investidas habituais nesses locais. Começou a fazer perguntas e mais perguntas. Ela começou a dar respostas e mais respostas, pensado a cada segundo que mulheres não gostam de perguntas e sim de afirmações, já que demonstram atitudes. Ela não disse a ele, mas estava claro em seus olhos negros e em sua expressão que, mesmo ele sendo agradável, educado e gentil, só responder a perguntas não era o que ela buscava nesta noite. De súbito ela lembrou-se que não sabia o que buscava naquela noite e nem nas noites anteriores e menos ainda nas noites que estavam por vir...
O tempo não parava e as risadas e conversas foram diminuindo pelo salão, porém sem cessarem.
Ela já sentia correr pelo corpo o torpor típico do álcool, aquela sensação de leveza e vazio. Uma música lenta invadiu o espaço e também sua alma. Encarou profundamente aqueles olhos verdes que a fitavam e sorriu. Para ela tudo continuava na mesma nostalgia, a não ser pela música que lhe penetrava os sentidos e trazia lembranças.
Ele também sentia o torpor, mas não o que vinha do álcool e sim o que brotava daqueles olhos negros, brilhantes e profundos. Para ele, a vida de repente pareceu ter apenas um sentido: senti-la em seus braços.
Ela não esperava por nada e achou, sinceramente, que foi por isso, e apenas por isso, que ficou tão surpresa quando foi puxada pelo braço e sentiu sua cintura ser entrelaçada com firmeza e doçura. Então, jogou os cabelos para trás, sorriu mais uma vez e deixou-se envolver por aqueles braços, que a guiavam no ritmo da música.
Os corpos se encostaram, os cheiros se misturaram, os lábios se tocaram e ela pensou: isso pode ser um tipo de lucro, comparada a rotina do meu quarto vazio...